Opinião | Recordando Uma Juventus Não Muito Distante
Depois do escândalo que foi o CalcioPoli, em 2006, o retorno da Juventus aos grandes palcos não se fez esperar, muito em função de uma fervorosa massa adepta e de jogadores com uma lealdade ímpar que se mantiveram no clube, nos seus tempos mais difíceis, não se importando de jogar na Serie B, algo que, no final de contas, até acabou por ser apenas uma temporada. Foram os casos de Gianluigi Buffon, Alessandro Del Piero ou Pavel Nedved, eles que foram, assim, fundamentais para que o reerguimento da Vecchia Signora não tardasse.
Com efeito, apenas seis anos depois (digo apenas, porque considero este um intervalo de recuperação curto face à dimensão do sucedido), lá estava a Juventus a vencer de novo um scudetto. Com Antonio Conte ao comando, a Juventus foi tricampeã italiana – em 2011/2012, 2012/2013 e 2013/2014 –, regressando à ribalta europeia. Não obstante os sucessos internos, os Bianconeri manifestaram algumas dificuldades nas competições europeias, problema que foi prontamente ultrapassado com a chegada de Massimiliano Allegri, isto depois de Conte ter saído, no verão de 2014, para ir treinar uma seleção italiana perdida depois de um Mundial desastroso com Cesare Prandelli como selecionador.
Allegri tinha a árdua tarefa de fazer esquecer Conte. Não só o conseguiu, como suplantou o compatriota
Inicialmente, a eleição do até então treinador de um Milan entretanto a vaguear pelas ruas da amargura para suceder a um Conte vincitore foi muito contestada pela imprensa transalpina e pela massa adepta (eu mesmo devo confessar que fiz “cara feia” àquilo que me tinha parecido acabar de ser um enorme downgrade). No entanto, o recém-chegado técnico fez pela vida, como se diz na gíria, e transformou a Juventus numa das melhores equipas da Europa. Não será esta a opinião da maioria, mas eu acredito, inclusivamente, que, desde que Allegri assumiu as rédeas, a melhor Juventus foi mesmo a da primeira época – 2014/2015 – e é essa Juventus que me proponho a recordar neste artigo.
Allegri é o rosto de uma Juventus vencedora internamente e que voltou a ser respeitada internacionalmente
A Juventus de 2014/2015 era uma equipa estratosférica a todos os níveis. Em primeiro lugar, era, quiçá, inigualável a nível europeu no que se refere a experiência, que foi essencial na boa campanha europeia e na conquista da dobradinha internamente. Do mesmo modo, reunia um conjunto de individualidades como dificilmente voltará a reunir, o que se relaciona diretamente com a notável qualidade individual dos jogadores que se encontravam nas suas fileiras. Para além disso, tinha um coletivo extraordinário. Efetivamente, a maturação da equipa atingiu o pico, com jogadores que já jogavam há vários anos a entenderem-se, a nível de movimentos, de olhos fechados. A esse coletivo extraordinário e ao grande entrosamento entre os seus vários elementos associava-se a assinalável maleabilidade tática – a qual ainda é uma das suas imagens de marca, na atualidade –, que tornava os futuros tetracampeões italianos num conjunto imprevisível. Por fim, a profundidade do plantel era outro fator que presidia às boas performances e à solidez mantida pelo coletivo ao longo de toda a temporada.
À data de 2014/2015, a Juventus era, discutivelmente, a segunda melhor equipa do mundo, apenas superada pelo Barcelona
Passando ao plantel propriamente dito, surgia Buffon na baliza (que ainda por lá continua, qual lenda) e Storari como principal alternativa (talvez esta não fosse a posição mais bem servida em termos de suplentes). No eixo da defesa, Chiellini e Bonucci eram titulares indiscutíveis, sendo de se salientar o facto de Allegri até se poder dar ao luxo de deixar no banco Barzagli (!) ou o próprio Ogbonna. No flanco direito da defesa, um Stephan Lichtsteiner em grande forma era praticamente intransponível (creio que, na altura, era o segundo melhor lateral direito da Europa, apenas superado por Dani Alves, então jogador do Barcelona), denotando-se ainda a garantia que Cáceres representava (nessa época – por sinal, a sua última –, até jogou mais vezes a defesa central), ele que marcou, a título de curiosidade, um golo decisivo para o desfecho do campeonato em Nápoles, na vitória dos Bianconeri por 3-1. Já no flanco esquerdo da defesa, o experimentadíssimo Patrice Evra nunca comprometia, defendendo com segurança e envolvendo-se de forma muito interessante no ataque. O seu substituto era o abnegado Kwadwo Asamoah (que hoje, curiosamente, continua com o mesmo papel), atleta que, na maioria das equipas da Europa, seria titular de caras.
Buffon, Chiellini e Bonucci – os esteios da defesa Bianconera em 2014/2015
Passando agora para o meio-campo, Andrea Pirlo era o main-man, o homem que acendia as luzes do jogo Juventino. Aos 35 anos, jogou ainda a bom nível – pese embora o facto de esta ter sido, a nível individual, a sua época menos brilhante ao serviço da Vecchia Signora –, construindo a partir de trás jogadas mortíferas para a defesa adversária. Foi absolutamente decisivo para a estabilidade emocional da equipa ao longo de uma época de grandes conquistas enquanto campeão do mundo e campeão europeu por mais de uma vez (ao serviço do Milan). Na posição 6, o backup de Pirlo era Marchisio, Il Principino, jogador de combate, completíssimo, sempre muito fiável. Ao lado de Pirlo, jogavam Vidal e Pogba (que luxo!), jogadores que, para além de fornecerem proteção defensiva ao lendário médio italiano, permitindo-lhe distribuir o jogo, eram ainda temíveis no ataque, destacando-se pela resiliência e espírito de combate e pela técnica e pelo estrondoso remate de longa distância, respetivamente. Para além dos jogadores já referidos, havia ainda Sturaro e Pereyra – este último um jogador especialmente interessante, pelo que tive pena que não continuasse a crescer na Juventus – dois médios que, sempre que entravam em campo (geralmente, a meio da partida) correspondiam, quase sempre positivamente.
Arturo Vidal e Andrea Pirlo, dois dos principais rostos de uma Juventus absolutamente brilhante
Para terminar, o ataque era temível. O indiscutível Apache Carlitos Tévez fazia dupla, durante a maior parte do tempo, com um então entusiasmante jovem talento chamado Álvaro Morata e o suplente Fernando Llorente era garantia de golos quando entrava. Os avançados Bianconeri eram de tal nível que os responsáveis do clube se puderam dar ao luxo de deixar a formiga atómica, Sebastian Giovinco, sair para o Toronto, da Major League Soccer, no mercado de janeiro!
Carlitos Tévez e Morata. Uma dupla temível
A nível de resultados propriamente ditos, a Juventus conseguiu, como referido, a dobradinha (Serie A e Coppa Italia) e realizou uma grande campanha na Liga dos Campeões, onde só foi parada, na final de Berlim, por um Barcelona galáctico, deixando pelo caminho adversários como Real Madrid, Borussia Dortmund ou Monaco. Recordo com saudades aquela equipa, muito graças às suas míticas individualidades e ao meu ídolo neste desporto, Andrea Pirlo, que me fez ver o futebol de uma outra forma. Espero tê-la relembrado dignamente.
FONTE: DABANCADA.COM