A anatomia de um adeus: os bastidores da rutura entre Cristiano Ronaldo e o Real Madrid

A data é 11 de maio de 2017. Cristiano Ronaldo organiza uma reunião em casa de Jorge Mendes, na luxuosa urbanização de La Finca, nos arredores de Madrid, com o seu agente e outros assessores, pessoas da sua confiança a quem entregou as rédeas dos seus ganhos nas chatas relações com o fisco, para se preocupar apenas com uma coisa: jogar futebol.

O "El Mundo", num texto assinado pelos jornalistas Esteban Urreiztieta e Orfeo Suárez, diz que esse 11 de maio de 2017 foi o dia que marcou o início do fim da relação do português com o Real Madrid e com Espanha, que o acusava de fugir ao fisco, de não declarar milhões em direitos de imagem.

"Quem é o responsável por isto?", terá perguntado o português, depois da justiça o acusar de fuga ao fisco. "Doutor, eu disse-lhe que não queria riscos!", continuou, dirigindo-se a Carlos Osório, um dos braços-direitos de Jorge Mendes (e dos jogadores de Jorge Mendes) em questões fiscais.

O questionário de Cristiano terá continuado, face ao silêncio dos restantes presentes, conta o diário espanhol."Não tenho estudos. A única coisa que fiz na vida foi jogar futebol, mas não sou parvo e não confio em ninguém. Por isso é que quando contrato um assessor pago sempre mais 30% para lá do que me pede, porque não quero problemas".

Perante a insistência de Cristiano, Osório terá finalmente falado: "Cris, o responsável sou eu. Mas fica calmo, está tudo bem e vamos dar luta a isto até à morte". Estas palavras terão sido recebidas com desconfiança por parte de outros assessores do jogador, que sabiam que, não, nem tudo estava bem com as obrigações fiscais do jogador português.

Diz ainda o "El Mundo" que isso terá contribuído para que Cristiano Ronaldo demorasse a perceber a gravidade da situação e a necessidade de fazer um acordo com o fisco. Cristiano acreditou sempre que nada havia sido feito de errado. "Eu nunca disse para que não se pagassem os impostos! Quero saber o que se passou. Não percebo nada disto, os impostos quem tem de pagar são os patrocinadores, porque me acusam a mim?", terá também dito, de forma enfurecida na reunião.

O jogador português acreditava que a forma de cumprir as obrigações fiscais eram iguais quando se negociava com clubes ou com patrocinadores. Não é, quando se negoceia direitos de imagem, é o próprio que tem de tratar dos respetivos descontos.

A "traição do Real Madrid"
Cristiano também não estava completamente informado sobre as diferenças que existem entre o fisco britânico e o espanhol: em Inglaterra, os futebolistas podem desviar de forma legal 50% dos seus direitos de imagem para sociedades com sede fora do país.

Em Espanha essa prática é ilegal, mas segundo o "El Mundo", os assessores de Cristiano não o informaram dessas nuances.

Já depois do mal feito, Cristiano passou a acreditar que Florentino Pérez o apoiaria nesta questão, tal qual a direção do Barcelona havia feito com Leo Messi e outros jogadores dos catalães. Mas o Real Madrid colocou-se fora da questão, algo que caiu muito mal no português.

E pior ainda ficou quando percebeu que não existia vontade por parte do Real de lhe melhorar o contrato, algo que o Barcelona havia feito com Messi de forma encoberta, precisamente para mitigar as suas perdas, depois de pagar milhões ao fisco.

Mas Cristiano queria voltar a ser o mais bem pago do Mundo, e não o terceiro, atrás de Messi e Neymar, por outras razões. "É um falta de respeito que eu, Bola de Ouro, ganhe menos que Messi e Neymar. Não é dinheiro: é status, é respeito", terá dito.

Finalmente, no final da última temporada, o Real Madrid ofereceu ao jogador um contrato de 25 milhões de euros anuais, que só chegaria aos 30 milhões, o valor que Cristiano pedia, mediante algumas variáveis de desempenho. O português não terá ficado contente e terá confidenciado aos mais próximos que a época 2017/18 seria a última em Madrid.

E seria a última também por não se sentir devidamente valorizado, porque acreditar que sempre seria visto como o segundo melhor jogador da história do Real e não o primeiro. "Colocam-me sempre atrás do Di Stéfano. Já não sei mais o que fazer".

A proposta de 150 milhões
Antes de finalmente deixar o Real e assinar pela Juventus, houve outras hipóteses para Cristiano. Diz o "El Mundo" que o Milan chegou a apresentar uma proposta que oferecia 150 milhões de euros ao português em cinco anos. O avançado terá estado inclinado a aceitar, mas acabou por não o fazer.

Já o Manchester United apresentou uma proposta demasiado baixa para as pretensões do Real Madrid, que pedia 100 milhões pelo português. O Paris Saint-Germain também se acercou de Jorge Mendes para contratar o português, tal como Carlo Ancelotti, que o queria no Nápoles. E só não avançou porque o presidente dos napolitanos considerou que o negócio iria arruinar o clube.

Face aos avanços e recuos dos vários clubes, terá sido o próprio Cristiano a pediu a Jorge Mendes para apalpar o pulso à Juventus. "Gosto da Juventus porque é um clube organizado e não me esqueço que tentaram contratar-me quando ainda estava no Sporting", terá dito ao agente.

A primeira aproximação a Andrea Agnelli terá sido feita precisamente quando Real Madrid e Juventus se enfrentaram na Liga dos Campeões. A ideia amadureceu no líder da equipa de Turim, desesperado para levar a equipa à vitória na Champions e bem ciente do impacto mediático e financeiro que teria a chegada de Cristiano.

Por fim, Agnelli também ganhou o português ao garantir-lhe um sistema fiscal bem mais simples e simpático para os futebolistas.

Conta o "El Mundo" que quando Cristiano decidiu assinar pela Juve, não houve volta a atrás, mesmo que Jorge Mendes acreditasse que Florentino Pérez iria jogar uma última cartada, oferendo a Cristiano Ronaldo aquilo que queria.

E assim, Cristiano Ronaldo fez as malas e foi para a Serie A.


FONTE: TribunaExpresso