O homem sem braço-direito

Foi assim: o SLB cortou rente o braço direito de Luís Filipe Vieira para que aquele se defendesse, escreveu a SAD, das coisas que andara a fazer por sua conta, estilo agente descontrolado. E fê-lo a dois dias do jogo com o adversário que tem o péssimo hábito de atropelar os clubes portugueses.

Um cínico diria que o adeus formal do Benfica a Paulo Gonçalves foi detalhadamente planeado, da escolha das palavras ao calendário. É que, sem querer, os administradores conseguiram duas coisas: se o Benfica for implacavelmente derrotado pelo Bayern de Munique – e não há problema algum, já aconteceu antes e a outros – os adeptos e os media e os críticos não vão apontar o dedo a Vieira por encobrir o ativo tóxico dos 79 crimes imputados; por outro lado, o facto de ter despachado Gonçalves a 48h do embate, e não imediatamente antes ou logo depois, cria a ilusão de que uma coisa não tem nada ver com outra, dando tempo à ideia para crescer e amadurecer.

Quando derem por ela, Gonçalves já era, o Benfica seguiu o seu rumo, etcetera, etcetera, etcetera.

E assim se encerra uma ligação de 11 anos, começada em 2007, o ano em que o futuro ex-homem forte do futebol José Veiga convenceu Luís Filipe Vieira a contratar Paulo Gonçalves para assessorar juridicamente o clube. Gonçalves, portista fanático, tinha um passado ligado ao FC Porto e depois ao Boavista, e foi desconfiadamente aceite na SAD encarnada no início por isso mesmo. O seu trabalho era relativamente simples – redigir contratos e rever cláusulas –, mas os seus conhecimentos anteriores levaram-no para outro lado, transformando-se num exímio lobista, sobretudo junto dos clubes do norte.

Fez-se, então, o proverbial braço direito do presi Luís Filipe Vieira nas complicações e nas celebrações, o homem providencial nas reuniões da Liga e, por exemplo, o mentor do processo que se quis imputar a Jorge Jesus por traição.

Até que o seu nome apareceu prolixamente nos e-mails que toda a gente leu: as atitudes e os comportamentos pouco claros, a proximidade nada saudável com árbitros, ex-árbitros, um observadores e o chefe dos mesmos, e, finalmente, o descaramento de corromper oficiais de justiça para violarem o CITIUS, asfixiaram-no. A queda era inevitável e era também uma questão de tempo ou de timing; agora que se fala num hacker emigrado, chegou o momento.

Fica por saber-se o que as partes disseram uma a outra antes da despedida que expõe, uma vez mais, as fragilidades da comunicação do Benfica (a alusão às atividades extra-curriculares é cómica) e a suspeita de que isto poderá não ficar por aqui.


FONTE: TribunaExpresso