O Engenheiro do Penta nasceu há 20 anos. Esta reportagem também

Hoje, 22 de maio de 2019, passam-se exatamente 20 anos sobre o dia em que o FC Porto chegou ao pentacampeonato (1-1, em Alvalade, jogo para o qual entraram já campeões em virtude do empate do Boavista com o Farense). Nenhuma outra equipa fez o mesmo antes ou depois. Esta reportagem, com Fernando Santos e a sua família, foi escrita também há 20 anos, é agora republicada - depois de a ler, perceberá que o engenheiro mudou pouco ou nada desde então. O artigo "O Engenheiro do Penta" foi publicado na revista do Expresso em maio de 1999.

No "Jogo Falado", Pinto da Costa surpreendeu com a medida encontrada para elogiar as qualidades humanas do treinador Fernando Santos. “Ele é melhor pessoa que vocês os quatro juntos”, disse, virando-se para o jornalista Paulo Catarro, e para Fernando Seara, Santana Lopes e Francisco José Viegas — os comentadores residentes naquele programa da RTP2. O engenheiro electrotécnico, que o grupo hoteleiro árabe Albaker emprestou ao futebol, a tempo inteiro, há cerca de três anos (era director de manutenção do Estoril Palace e foi responsável pela parte eléctrica do Hotel Penta), é aquele tipo de pessoa que todos gostam como amigo. Por detrás do ar vagamente mal disposto, está uma boa pessoa.

É socialista e homem de fé. Fez campanha pelo “Não” no referendo sobre o aborto. Sempre que há eleições é delegado do PS às mesas de voto. Não adormece sem fazer as suas orações. Não passa um dia sem participar na eucaristia. E durante a missa, na Igreja das Antas, costuma ler a Bíblia em voz alta. Mas a vida e Deus têm sido generosos na hora de pagar os dividendos devidos a esta bondade. “Era para ser nada e acabei por ser tudo”, sintetiza Fernando Santos, nascido a 10 de Outubro de 1954 na Maternidade Alfredo da Costa, filho único do matrimónio entre Maria de Lurdes, doméstica, e um comerciante que comprava e vendia acessórios para automóveis. Uma família entre o pobre e o remediado.

O pai, Francisco Costa Santos, a quem dedicou no domingo (a meias com Pinto da Costa) a vitória no campeonato, era doente pelo Benfica. Foi guarda-redes internacional militar, defendeu a baliza do Operário e tinha a alcunha de “Sapo”, por causa da configuração das mãos. A caminhada do clã Santos até ao cimo da montanha, que o filho concluiu, começou ainda antes dele nascer.

Quando casaram, os pais foram viver para um quarto para os lados da Feira da Ladra. Logo que nasceu mudaram-se para um apartamento alugado na Penha da França. Fernando começou por dormir num divã, no hall de entrada. Aos 9 anos, o pai montou uma indústria, a vida melhorou e ele passou para um sofá-cama na sala da acanhada casa da Penha da França, onde se fez homem e futebolista.

Hoje é proprietário de um bela vivenda numa zona sossegada em Cascais, com snooker e sala de jogos na cave, piscina, e escritório no sótão forrado a madeira — e lugar para as recordações das três décadas que leva de futebol profissional. A mulher, Gui (de Guilhermina), professora do Ensino Básico, e os filhos — Cátia Raquel (estudante no 2° ano de Direito, nascida a 25 de Abril de 1979) e Luís Pedro, 15 anos, aluno do 10° ano, nos Salesianos — a vivenda a que ele regressa episodicamente habitam desde que está para o Porto.

“O cavalo só pára uma vez à frente da nossa porta. Deve-se montá-lo logo”. Se melhor o pensou, melhor o fez. No dia seguinte a António Oliveira ter ganho para os dragões a Taça de Portugal 97/98, Fernando Santos reuniu a família e todos foram unânimes em aconselhá-lo a não olhar para trás. Além da família também ficaram adiados os encontros com os amigos do bridge de sexta-feira à noite, e os do ténis de sábado de manhã, momentos e prazeres sacrificados à perspectiva de um grande salto em frente na sua carreira profissional. Pode viver-se sem dinheiro. Pode viver-se sem família. Pode até viver-se sem viver. Mas é impossível ir em frente sem ter sonhos na cabeça.

Tal como os emigrantes dos anos 60, que partiam sozinhos e só depois de terem a certeza da perenidade e justeza da opção chamavam a família, habita um apartamento alugado, na Avenida dos Combatentes, nas Antas, a escassas centenas de metros do estádio onde trabalha e da igreja onde alimenta a fé que lhe permitiu aguentar o longo ano em que esteve separado da família e exposto à pressão de estar proibido de perder o título.

“Não fazia sentido retirar os filhos do seu habitat natural. A Gui tinha as aulas. O rapaz está nos Salesianos desde os 6 anos. A minha filha já namora. Ambos são bons alunos e mesmo à distância acompanho os estudos ao milímetro”. E aos fins-de- semana, a mulher pega no BMW e vai ter com ele ao Porto. No domingo, na vivenda de Cascais, com a enxurrada de parabéns a não darem descanso à campainha do telefone, o clã — reforçado pelo namorado de Cátia —, sentado à mesa da sala desfrutava a doce calma da descompressão, enquanto folheava os jornais do dia. Desde cedo que o futebol passou a ser muito importante na vida do pequeno Fernando. A 1 de Dezembro de 1954, com menos de dois meses de existência, foi ao jogo inaugural do Estádio da Luz numa alcofa.

O pai submetia-o a intensos fins-de-semana benfiquistas, acompanhando juvenis, juniores e seniores. E como a sua rua, na Penha da França, era frequentada por um marinheiro fardado, não é de espantar a sua primeira formulação para a crucial questão “o que é que queres ser quando fores grande ?”: “Quero ser como o Costa Pereira e oficial da Marinha”. O pai também queria que ele fosse guarda-redes. Mas as primeiras e más experiências no posto (“Fartei-me de levar boladas até que um dia rasguei as calças e quando cheguei a casa ainda levei pancada”) levaram-no a adiantar-se até ao meio campo, acabando por fazer a carreira entre defesa central e libero.

Começou a fazer currículo jogando nas variantes de onze e de salão em torneios entre equipas de bairro, e representando selecções das escolas que frequentou (n°68, Nuno Gonçalves e Afonso Domingos), onde jogou ao lado de Inácio, que entretanto foi para o Sporting. Até que, aos 15 anos, já como júnior (nunca foi juvenil federado), envergou pela primeira vez a camisola verde e preta do Operário, de onde transitou para o Graça, que militava na II Distrital. Nestas deambulações pelas divisões menores ganhou duas alcunhas — “Sono”, por não gostar de correr, e o “Comprido, em homenagem ao salto que a sua altura deu na baixa adolescência (aos 15 anos media o mesmo que agora).

O pai, que vigiava com rigor e detenção o evoluir dos seus estudos, não o deixava por o pé em ramo verde. Aos 15 anos, quando passou a federado, já tinha o curso de montador electricista, que o habilitava a carteira profissional e a fazer a Secção Preparatória nos Institutos. Aos 17 anos, sem dar cavaco em casa, foi com uns amigos da Graça a um treino de captação no Estádio da Luz.

Deu nas vistas, até por ser grande. Angelo, a meio do treino, perguntou-lhe a idade. Quando soube que ele era espigado de corpo mas também de idade mandou-o abandonar o relvado: “Isto aqui é para miúdos. Sai e vai ter comigo à sauna”. Estava ele preparado para ouvir a extensão do raspanete quando as palavras do treinador lhe soaram como música aos ouvidos. Estava convidado para ficar nos juniores do Benfica, que se comprometia a pagar os estudos e ainda lhe dava mil escudos por mês.-lhe.

Não descansou enquanto não deu a boa nova lá em casa, convencido de que ia haver foguetes na Penha de França. Mas em vez de foguetes houve foguetório. “Disse ao meu pai: `Vou jogar para o Benfica'. Ele respondeu: `Não vais!' Caiu -me o céu em cima da cabeça”. Um acordo familiar ultrapassou o contencioso. A permanência no futebol ficou indexada ao rendimento escolar. Ao primeiro chumbo pendurava as botas. O negócio foi eficaz: tomou -se engenheiro e jogou até aos 33 anos. Aterrou nos juniores do Benfica como um ET. Era um intruso numa equipa que vinha junta desde os juvenis, onde pontificavam o guarda-redes Amaral, Norton de Matos (director-geral da Unisys) e Oeiras, tio de Claudio Oeiras, o jogador do Torreense que marcou nas Antas o golo que eliminou o FC Porto da Taça de Portugal e que foi responsável pelo pior momento por ele vivido nesta época. Não pegou de estaca. Angelo, que o tinha recrutado, não o punha a jogar com regularidade. Fernando Cabrita, que orientava a equipa, não percebia por que é que o jovem central não era mais utilizado. Hagen, o inglês que treinava a equipa principal, também tinha boa impressão dele e deu até uma entrevista em A Bola em que lhe vaticinava "um grande futuro". As coisas começaram a correr mal na preparação das meias-finais com o Sporting. Treinos de manhã e treinos à tarde.

E à noite tinha de estudar, pois era época de exames e a espada de Dâmocles paterna pendia sobre a sua cabeça. Era ocupação a mais, apesar de ele estar motorizado desde os 18 anos — o pai, que negociava no ramo automóvel, teve sempre carros, mesmo quando o dinheiro era factor escasso lá em casa, e ofereceu-lhe em 1972 um Mini, que custou 28 contos, para ele não perder tempo nas deslocações entre casa, a Luz e o Instituto Industrial. Até que lhe saltou a tampa. Nos balneários, pouco antes das meias-finais com os leões, soube que ele, o defesa central a quem Hagen augurava grande futuro, estava escalado para guarda-redes suplente. Aguentou o desaforo pouco tempo.

Estava a partida a meio da primeira parte quando se levantou do banco, foi trocar de roupa ao balneário e partiu para as Gaeiras, entre as Caldas e Óbidos, onde a família alugara uma casa de férias. Nesse ano, o FC Porto foi campeão nacional de juniores. No Verão de 73, Fernando estava convencido que o futebol a sério tinha acabado para ele e que não voltaria a pôr os pés na Luz. Pediu ao pai para ir lá receber a carta, de modo a libertar-se para voltar a alinhar no Operário ou no Graça. Mas o Benfica não estava disposto a abrir mão dele. •Francisco Santos trouxe-lhe o recado: "O Hagen quer a treinar-te nos seniores". E voltou...

Durante três meses conviveu com Artur Jorge, Eusébio, Nené, Jaime Graça, Toni e José Henriques. "Éramos tantos que às vezes nem dava para eu jogar nos treinos de conjunto".

O Benfica queria emprestá-lo ao Gouveia, mas ele não estava para ir para a serra. Estavam as coisas neste impasse quando estalou a bronca. Hagen fez as malas e abandonou a Luz, quando Borges Coutinho o obrigou a fazer alinhar Toni e Humberto na festa de Eusébio, contra a vontade do técnico, que os queria castigar por indisciplina. O treinador foi para o Estoril, que estava na II Divisão, e levou Fernando, que a 4 de Dezembro de 1973 assina um razoável contrato como profissional: quatro contos, um quinto do que ganhavam os craques encarnados, mas nada mau para um jovem estudante de 19 anos.

Tinha condições para jogar à bola. Lia bem o jogo e era muito rápido». Esteve no Estoril de 1973/74 até 1978/79. Subiu quatro vezes e desceu uma vez, jogando na I, II e 111 divisões com a camisola canarinha e os calções azuis. Em 1978, coroou seis anos e meio de namoro, casando com Gui no Mosteiro dos Jerónimos, e formou-se em Engenharia. Em 1979, o Marítimo desinquieta-o com uma proposta milionária: 200 contos de luvas, mais 70 contos/mês, casa paga, emprego para a mulher (a 12 contos/mês), fora os prémios de jogo. Não resistiu e durante um ano fez parte de uma bela equipa do Marítimo, onde alinha Luís, Pedroto e Peter.

Apreciou a estadia no Marítimo, gostavam dele mas a mãe estava doente. Queria regressar ao continente. Recusou uma proposta de 120 contos/mês para ficar, e aceitou o regresso ao Estoril ("O treinador-jogador era o Torres que se equipava no cacifo ao lado do meu») a ganhar menos de metade, mas com a condição de lhe arranjarem um emprego. Benito Garcia, o presidente, era dono de três hotéis (Estoril Sol, Estoril Plage e Madeira Palácio) garantiu-lhe emprego numa das suas unidades da linha ou na Câmara de Cascais. Alguns meses volvidos, após um estágio no Madeira Palácio, tomou-se, a 5 de Janeiro de 1981, director dos'serviços de manutenção do Estoril Sol, funções que acumulou com a responsabilidade pelos serviços eléctricos do Penta, quando o grupo Albaker comprou os hotéis de Benito Garcia.

Entre os 26 e os 42 anos acumulou duas profissões: a de futebolista (e depois a de treinador) e a de engenheiro. "Durante 16 anos não gozei férias. Quando estava de férias no futebol tinha de estar no hotel". No Palace foi responsável por elevados orçamentos, designadamente quando geriu uma redecoração que custou mais de um milhão de contos. Foi jogando no Estoril até que a idade, aliada a um convite do seu amigo Fidalgo, o atiraram para o banco como treinador-adjunto. O antigo guarda-redes rumou a Norte, aceitando um atraente convite para treinar o Salgueiros. Com 33 anos, Fernando assume as funções de treinador principal do Estoril, onde fica 7 anos, levando por duas vezes o clube à primeira divisão.

Até que em 94, a equipa balança à beira do precipício da descida e o recém-empossado presidente do Estoril, Nunes de Carvalho — então candidato social-democrata à Câmara de Cascais — despede-o, induzindo, sem querer nem saber, uma mudança radical na carpintaria da vida de Fernando. Os Santos da Penha da França sempre foram uma família católica. O pai, Francisco — que lhe dera uma meia irmã mais velha, a viver actualmente na Holanda —, de vez em quando levava a família a Fátima, mas, recorda Fernando, era, neste particular, "ciclista não pedalante": "Não me lembro de ele ir à igreja senão em casamentos, baptizados ou funerais". O treinador não gostou da explicação arranjada para o mandarem embora. «Disseram-me que queriam construir uma equipa à base de futebolistas da casa.

Ora, eu tinha subido com 18 jogadores feitos no Estoril». Por isso não aceitou a sugestão de se despedir. "Desafiei-os a irem à cabina perguntar aos joga - dores se queriam que eu me fosse embora. Se houvesse um só que se manifestasse nesse sentido eu demitia-me. Senão tinham que me pagar tudo". Tiveram de lhe pagar tudo. Passadas três semanas já estavam a convidá-lo para director-geral, mantendo-se Carlos Manuel (o seu substituto) como treinador. Recusou e jurou a si mesmo que só voltaria ao se Estoril Praia como presidente. "Fiquei triste porque aquilo era uma família. Eu fazia de `chauffer' da equipa e muitas vezes, por falta de água quente, tínhamos de ir tomar banho a casa do Lachever".

Além de triste, ficou com disponibilidade de espírito, algum tempo livre e sem desculpa para continuar a adiar a frequência de um curso de cristandade para o qual estava convidado pelo sacerdote Luís. Fernando conheceu ocasionalmente o padre em casa do médico Pinto Coelho e deu-lhe boleia. Na viagem trocaram impressões sobre religião.

A sede do treinador por conhecimentos neste área estava aguçada por ter na família uma Testemunha de Jeová. O padre municiou-o com um livro, A Fé Explicada, que o ajudou a perceber racionalmente o sentido da fé. O resto, a emoção, foi no retiro. "Tinha acabado de ser despedido do Estoril e por isso tinha tempo. Fiz a mala e lá fui eu sozinho com mais 30 tipos que não conhecia de lado nenhum para o curso". Deu-se o clique. "Fui iluminado pela fé e descobri o amor. Há coisas que só se sentem, não se explicam por palavras". Tornou-se militante católico.

Ele que já era uma espécie de padrinho profissional (tem 40 afilhados) começou a dar cursos de preparação de baptizados. Nunca mais adormeceu sem fazer as suas orações. Todos os dias participa na missa. "Tenho um grande amigo com quem falo muitas vezes. É Cristo". A mudança para o Porto não fez abrandar o seu activismo católico. Está ligado à paróquia das Antas. Lê regularmente na missa, "para não perder a prática". E todas as quintas-feiras, o seu movimento de leigos reúne no Seminário do. Vilar, dirigido pelo padre Múrias, um entusiástico portista. "Se não tivesse passado pelo curso de cristandade, se não fosse a fé, não teria conseguido aceitar a morte do meu pai, que era o meu melhor amigo. Quem não acredita na ressurreição não pode ser católico. Eu aguentei a morte do meu pai porque sei que vou voltar a encontrá-lo".

O despedimento no Estoril, que constitui um dos dois piores momentos da sua carreira desportiva — o outro foi a vitória do Torreense nas Antas, que atirou o FC Porto para fora da Taça — abriu-lhe o caminho para a fé e foi encarado por Fernando Santos como um adeus ao futebol. Mais uma vez se enganou.

O destino pregou-lhe outra partida. "Julgava que tinha acabado o futebol de vez quando, alguns meses depois, recebi um convite para ir treinar o Estrela. Aceitei porque como treinador ainda não tinha passado o teste do mercado. No Estoril era da casa. Fui para a Amadora para provar a mim próprio que era capaz de ser bom como treinador." Conseguiu provar -o que queria. Durante os três anos que esteve no Estrela, não só manteve a equipa na I Divisão como ainda conseguiu que uma equipa de orçamento reduzido praticasse alpinismo na tabela classificativa.

No primeiro ano foi 13°, no segundo 9°, no último 7°, ficando então às portas da Europa. Esta progressão não passou despercebida a Pinto da Costa, que sugeriu à Federação Portuguesa de Futebol a sua contratação para o lugar de seleccionador nacional. Madail preferiu Humberto Coelho. Muita gente pensou que o presidente do FC Porto estava na brincadeira. Não estava. Quando se tratou de substituir António Oliveira, foi buscar o engenheiro. O ano não começou bem. Longe da família, identificado como "mouro" e benfiquista, teve de engolir em seco quando sofreu os primeiros tropeções — as derrotas em Aveiro (2.ª jornada) e nas Antas com o Boavista (7.ª jornada) — e recorrer a toda a fé e força interior para aguentar a pressão. A eliminação da Taça de Por proporcionou-lhe dois dos três momentos mais marcantes da época.

"Dos 16 convocados para o jogo com o Torreense, 15 eram internacionais. Em condições normais, pega-se em 11 jogadores à sorte e mandam-se para o campo e, mesmo sem treinador, ganham ao Torreense. No final do jogo, o presidente levou -me a casa. Depois telefonou -me a convidar-me para jantar. Agradeci mas disse-lhe que não estava com disposição. Passado um bocado estava a tocar à porta. Ficou para ver o Setúbal-Benfica na televisão e durante o jogo trocámos impressões sobre a preparação da nova época. A maior parte do país conhece o presidente do Porto. Não conhece o homem Jorge Nuno Pinto da Costa".

Mudou muito, neste ano. Entrou no clube dos campeões, sendo o único treinador português em actividade que se pode gabar do feito. Emocionou -se nas bancadas do pavilhão das Antas quando a equipa de andebol conquistou o título de campeão nacional que interrompeu um jejum de 31 anos. Em casa, a mulher e os filhos, deixaram de ser do Benfica — passaram a ser "do Fernando Santos". E reavaliou a cidade e as gentes. "As pessoas recebem bem, há um ambiente de bairro de que gosto". O ambiente familiar reencontrou -o à mesa de jantar do Antunes, o restaurante da irmã e cunhado de Reinaldo Teles (já falecido).

"Tinha vindo umas cem vezes ao Porto mas só agora é que percebo a cidade. O Porto é como a fé. Quando vivia em Lisboa julgava exacerbado o sentimento regionalista. Depois vive-se cá e sente-se que é diferente. Aqui não há meio termo. Há amor e ódio. Em Lisboa, prepondera a indiferença. O Porto é como Amesterdão: à primeira vista parece uma cidade feia, fria e sombria. Depois conhece -se melhor e acha-se encantadora".

O sítio de que mais gosta é a Foz e as suas esplanadas. O pior é mesmo o clima. Convive mal como a fama. Sai pouco porque não gosta de ser notado. Sabe o que quer para o futuro. "A minha vontade era treinar o Porto durante muitos altos, com o objectivo de fazer uma equipa melhor. Temos grandes talentos e uma boa equipa. O desafio é construir uma grande equipa. Só vou embora quando me mandarem". E não se importa de pedir isso a Deus. Nem vê qualquer mal nisso. Ao fim e ao cabo, na principal oração católica — o Pai Nosso — pede-se sete vezes.


FONTE: TribunaExpresso