O mérito do SLB? O miúdo de aparelho nos dentes e cabelo à João Maria de Cascais que anda na vela e na equitação alternadamente

O sportinguista Diogo Faro escreve sobre o Benfica campeão na ótica da estratégia: o FC Porto foi arrogante, o Sporting foi astuto e construiu um guião digno de novelas, e o Benfica foi espertalhão, usando uma versão do Cavalo de Tróia a que chamaram Cavalo de Vitória. Para ler e sorrir

O futebol tem muito mais de estratégia do que possamos pensar. Quando digo “pensamos”, refiro-me a pessoas como eu que gostam muito de futebol, mas não são filósofos da bola que aspiram a ser uma mistura de Luís Freitas Lobo com Gabriel Alves.

Claro que esses aspirantes a Josés Gomes Ferreira do futebol (um pouco redundante visto que ele sabe tudo sobre tudo do mundo, logo, especificar um assunto é ser redundante, perdoem-me) já sabiam disto, mas os mais afoitos, como eu, às vezes tendem a ver o futebol com mais paixão e menos razão.

Voltemos à estratégia no futebol.

Esta está presente, muito presente, não só em cada jogo individual, não só no planeamento do plantel e a sua gestão ao longo da época, mas logo desde início. Como os grandes jogadores de xadrez olham para o tabuleiro intacto e já sabem todas as jogadas que vão fazer, os grandes clubes também o fazem com a época desportiva.

No fundo, é exactamente ao contrário do que eu faço com a minha vida: olho para a futuro e penso "que se f*da, é ao calhas e logo se vê".

E nestas estratégias, as manobras de distração são fundamentais para tentar ludibriar os adversários. O Porto foi sobranceiro. Agarrou-se à conquista do campeonato no passado maio e apareceu na presente época todo bombadão, confiante, com pseudo ar de mau e um batido de proteínas (prota, para os amigos) na mão (se quiserem desconto na Prozis usem o código FRUTAECAFÉCOMLEITE10), para mostrar que esteve o verão todo a malhar. Mas o inchaço era mais do calor do que outra coisa qualquer, e ali no inverno começou a mirrar.

O Sporting foi astuto – arriscou muito, mas não podia ser de outra forma depois da época que acabara de fazer – e planeou a sua manobra ainda no decorrer dessa mesma época. Com uma equipa de guionistas que escreveriam as novelas todas da TVI e da SIC em simultâneo com uma perna às costas e outra no colo do Paulinho, desenharam a manobra de distração mais estapafúrdia. Juntaram uma data de gandins encapuzados, simularam um ataque a Alcochete, com gritos berros, sangue a fingir daqueles dos filmes, cintos de esferovite, duplos dos jogadores, e por aí fora, tudo bem feito. A encenação do drama continuou, com alguns jogadores a ir embora, outros foram e voltaram, um presidente deposto e toda a novela conhecida por todos.

O que pouca gente sabia, é que tudo isto foi planeado em segredo e foi tudo uma estratégia para os adversários acharem que o Sporting estava mais fraco e iria descer de divisão nesta época.

Engaranam-se, não desceu.

Mas, e embora seja um drama que mereça a nomeação para o Oscar (ou para Globo de Ouro da Caras, pelo menos), não deu para mais que um terceiro lugar.

O Benfica, e aqui mesmo como sportinguista tenho de o assumir, montou a manobra de distração perfeita. Enquanto Porto aparecia arrogante e demasiado confiante, e o Sporting tão dramático que o lema do clube quase passou a “Ser ou não ser? Eis a questão”, o Benfica jogou o carta do Cavalo de Tróia.

Ou, para ser mais preciso, o Cavalo de Vitória. Que estratégia foi esta? Simples. Desde o início que tinha tudo planeado entre direcção e Rui Vitória para jogarem mal, e até irem desperdiçando pontos, até levar os adeptos ao limite, por um lado, e os adversários à confiança máxima, por outro.

E assim foi. Em Janeiro, quando os incautos e desesperados adeptos encarnados já cuspiam raiva, enquanto choravam desilusão, do Cavalo de Vitória, que tinha entrado nas muralhas do campeonato com os adversários a achar que era um presente, sai de lá de dentro Bruno Lage. E pior (para quem não é benfiquista). Qual matrioska de manobra de diversão, de dentro do Bruno Lage sai o João Félix. Por esta é que ninguém esperava.

Ninguém desconfiava. Um treinador com cara de professor de Educação Física (daqueles porreiraços que dá futebol em quase todas as aulas, em vez de badminton e danças de salão), e uma criança imberbe que se apresenta de aparelho nos dentes e cabelo à João Maria de Cascais que anda na vela e na equitação alternadamente.

Daí, começaram a jogar bem à bola, enxurradas ridículas de golos e o resto é o que sabemos.

Agora, se dou os parabéns aos jogadores do Benfica e em quem pensou nesta estratégia? Claro que sim. Muitos parabéns! Se os dou aos meus amigos do Benfica que me vêm dizer “então, não me dás os parabéns por sermos campeões?”.

Poupem-me. O que é que fizeram para ajudar? Beberam cerveja enquanto diziam palavrões, e saltavam e gritavam nos golos?

Uau, que difícil. Eu também sei descascar camarões só com uma mão e ninguém me dá os parabéns por isso. Vá, vão festejar. Larguem-me.


FONTE: TribunaExpresso