O sumo de laranja é mais doce no quiosque do Bruno

Sporting vence Belenenses SAD por 8-1, no Jamor, e reforça o terceiro lugar no campeonato. Bruno Fernandes fez um hat-trick e chegou aos 31 golos.

Há rapaziada por aí a deslizar pelos campos esverdeados que, se estivéssemos distraídos, nos levaria a acreditar que as balizas estão maiores. Mas não estão e temos de analisar alguns fenómenos com a ternura que se olha um sobrinho. Bruno Fernandes, o senhor-jogador-capitão-faz-tudo, atingiu esta tarde os 19 golos no campeonato (31 no total) na vitória do Sporting por 8-1 contra o Belenenses SAD, no Jamor.

Este jogador, a quem perguntam a Keizer se estará comprometido por andar a ser assediado por gigantes europeus, é médio e, se olharmos para outros grandes médios que passaram pelo clube, deixaria todos corados. Comecemos pelo que é, para muitos, o mais especial que mora na lembrança dos sportinguistas: Balakov chegou aos 15 golos na liga em 93/94, foi o melhor registo (21 ao todo); Carlos Xavier não passou dos seis; Pedro Barbosa assinou nove golos em duas ligas; Rochemback chegou aos oito em 2003/04; Nani, numa tentativa de complicarmos a vida a Fernandes, não passou dos sete; Adrien Silva chegou aos oito em três ocasiões; Izmaylov-5; Matías Fernández-5; o máximo de João Mário, que muitas vezes gozava da vadiagem tática, chegou aos seis há três anos. Está tudo dito, certo?

Com Borja e Gudelj no onze, por Doumbia e Diaby, o Sporting cedo começou a apertar o cerco à baliza de Muriel. Cleylton tirou uma bola em cima da linha, logo aos 4', depois de uma perda de bola de Eduardo na tentativa de saírem de trás limpinho, algo que é inegociável para Silas. Este seria um prenúncio fatal para o que estaria por vir.

A tarde horrível dos rapazes do Restelo começou aos 10’, quando Muriel investiu num passe vertical que acabou por ser interceptado. Raphinha sentiu o cheiro do erro e fechou, roubou a bola e fez o um-zero.

O Belenenses SAD ia defendendo em 5-3-2 e, com bola, tentava projetar os alas Sagna e Zakarya, começando a jogar com três atrás. Procurava sair curto atrás para ganhar vantagem e espaço na frente para Diogo Viana e Licá. Ou, então, para defender com bola, frustrando os rivais. Eduardo era o farol e a equipa entrou bem.

O Sporting tinha paciência, tentava morder na pressão, queria explorar o campo todo, para tentar estender a manta da linha de cinco, e, para tal, eram preciosas as variações de flanco e leitura de Bruno Fernandes.

A bola dividia o seu tempo nos pés dos jogadores das duas equipas. Mas os erros estavam talhados para roçar só um lado. Depois de um passe genial de Bruno Fernandes, de primeira (tac!), Raphinha apareceu na cara de Muriel e o guarda-redes brasileiro derrubou o canhoto: cartão vermelho e vida difícil para a estrutura caseira. Entrou Guilherme Oliveira, um estreante que até se formou no clube de Alvalade e retardou o desastre total.

Mas seria inevitável.

Um lançamento com as mãos, pela esquerda, já muito perto da área, encontrou o calcanhar de Bruno Fernandes (doce, doce), que deixou Luiz Phellype com muito tempo para pensar de que forma queria atingir a felicidade. Foi para o lado direito do guarda-redes, 2-0.

Com dois golos de vantagem e mais um homem em campo, o jogo estava mais do que tranquilo e controlado… mas há sempre aquela atração pelo verbo complicar, por isso o Sporting deixou o Belenenses SAD reentrar em jogo (já numa espécie de 4-4-1). Depois do intervalo, e com os visitantes ainda mais subidos para sufocar qualquer ânsia dos homens da casa, Mathieu errou na construção, Llujic aproveitou, rematou e Renan defendeu; Licá, na ressaca, encostou para a baliza deserta: 2-1, é o décimo golo do avançado na liga. O complicómetro foi abafado logo a seguir, com felicidade, quando um remate de Gudelj desviou em André Santos e tranquilizou os leões (3-1).

A história dos últimos 25’ conta como é viver no céu e no inferno, sendo que o palco pisado era o mesmo. Marcaram-se cinco golos: Bruno Fernandes (penálti), Bruno Fernandes, Bas Dost (mais uma bola ao poste), Bruno Fernandes e Doumbia. O avançado holandês regressou aos relvados (bastou saltar para o aquecimento para ganhar uma ovação) e aos golos. Doumbia fechou a contagem, com assistência a meias entre Bruno Fernandes e a simulação do generoso Bas Dost.

Fechemos esta prosa como a começámos. Bruno Fernandes voltou a ser decisivo, pelo que joga e faz jogar, por estar aqui e ali; ora dá largura, ora toca atrás e, depois, aparece na área. Está em todo o lado, quer fazer tudo e é homem ideal para tomar conta do quiosque do sumo de laranja idealizado por Marcel Keizer, um holandês que arrancou a aventura em Alvalade com muitos golos. Se o hat-trick impressiona, se os tais 19 golos na liga (a dois de Seferovic) e 31 na totalidade também, seduz também a forma como sabe estar. Ele era todo sorrisos no final, claro, mais uma tarde épica, mas, quando se aproximaram jogadores do Belenenses, trancou a cara, respeitando o coração pesado e triste daqueles que acabavam de perder por 8-1.

É um grande futebolista.


FONTE: TribunaExpresso